sábado, agosto 2, 2025

Comprei um terreno no loteamento, mas até hoje não posso construir. E agora?

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Imagine o seguinte: um comprador, cheio de expectativas, assinou com a loteadora um contrato para adquirir um terreno, no entanto, a época da venda, o loteamento ainda não estava pronto para uso. Mas a empresa garantiu que cuidaria de toda a infraestrutura: abrir ruas, fazer a terraplanagem, pavimentar as vias, instalar meio-fio, rede de água, luz, esgoto e sinalização, tudo isso dentro de um prazo razoável estipulado em contrato.

Além disso, ficou claro que o comprador só poderia iniciar obras no terreno após a finalização das obras estruturais do loteamento, justamente para que houvesse tempo de execução dessas estruturas básicas. Só que o tempo passou, e nenhuma obra foi finalizada, nem ruas, nem água, nem energia. O terreno segue como no início: inutilizável. Resultado? O comprador não pode construir sua casa, nem sair do aluguel — que segue pesando no bolso mês a mês.

O problema se agrava porque a empresa não apresentou nenhuma justificativa plausível, nem documentos que comprovem qualquer situação que justifique o atraso. Em outras palavras, além de não entregar o que prometeu, ela também não dá nenhuma resposta concreta para a entrega das obras.

Essa situação gera frustração, insegurança e prejuízos financeiros. O comprador paga por algo que não pode usar, e ainda continua arcando com aluguel e outros gastos que já não seriam mais necessários se o terreno estivesse disponível para construção.

Mas o que fazer diante dessa situação?

A primeira coisa é entender que você não está sozinho. Casos como esse são mais comuns do que se imagina, e o Poder Judiciário tem se posicionado de forma firme para proteger os direitos de quem agiu de boa-fé na hora da compra.

Se a empresa não cumpriu com a entrega da infraestrutura no prazo previsto, e ainda não apresentou nenhuma justificativa válida, isso configura descumprimento contratual, nos termos do art. 475 do Código Civil. Além disso, por se tratar de uma relação de consumo, incide o Código de Defesa do Consumidor. O art. 14 da Lei nº 8.078/90 estabelece que o fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pelos danos causados pela falha na prestação do serviço.

Nesse caso, o comprador tem o direito de buscar na Justiça, a rescisão do contrato, ou seja, o encerramento da relação com a devolução dos valores pagos com correção monetária e juros.

Diante do atraso injustificado é possível de modo complementar, requerer a indenização por danos materiais, como o valor pago com aluguel e outras despesas extras; sem dizer que a depende do contrato é possível rever clausulas como cobrança pelo valor de corretagem, embutimento de IPTU entre outros.

Esses valores são ainda acrescidos de indenização por danos morais, pelos transtornos, ansiedade, frustração e prejuízos causados pela não entrega do lote.

Como tem se posicionado nossos Tribunais?

Os tribunais brasileiros, especialmente o STJ e os Tribunais de Justiça estaduais (como o TJMT e TJSP), têm adotado uma posição bastante protetiva em relação aos consumidores lesados por loteadoras que não entregam os terrenos ou descumprem os prazos para infraestrutura. Nesse sentido, têm reconhecido que a ausência de entrega do lote viabilizado e com as obras essenciais de infraestrutura configura inadimplemento contratual grave.

Além disso, os tribunais têm afastado cláusulas contratuais que impõem retenções abusivas, cobrança de comissão de corretagem não informada previamente, e outras imposições contratuais desequilibradas. A jurisprudência majoritária entende que a vulnerabilidade do comprador, especialmente quando se trata de consumidor que visa a moradia própria, impõe uma interpretação mais protetiva do contrato, com base no princípio da boa-fé objetiva e na função social do contrato.

A aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) é pacífica nesses casos, conforme já consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O contrato de promessa de compra e venda de terreno em loteamento caracteriza uma relação de consumo, sujeita às normas protetivas, inclusive no tocante à inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, CDC), o que favorece o comprador na produção de provas em juízo.

Por fim, o dano moral tem sido reconhecido com base na frustração da legítima expectativa de construir e residir no imóvel adquirido, nos transtornos emocionais decorrentes da manutenção do contrato descumprido e no desgaste enfrentado pelo consumidor, que muitas vezes continua pagando aluguel, taxas e parcelas de um imóvel que não pode utilizar.

Dessa forma, a tendência atual do Judiciário é de responsabilizar a loteadora de forma ampla, garantindo reparação integral ao consumidor lesado, com devolução dos valores pagos, indenização pelos danos experimentados e, quando for o caso, a condenação por danos morais — especialmente quando há omissão, má-fé ou descaso na condução das obrigações contratuais assumidas.

💬 Conclusão

Comprar um terreno representa mais do que uma simples transação — é o início de um projeto de vida. Quando a empresa vendedora não cumpre com o contrato e deixa o comprador desamparado, a Justiça deve atuar com firmeza. A ausência de entrega da infraestrutura dentro do prazo contratual frustra completamente o objeto do contrato, tornando sua execução inviável para o consumidor. Isso gera não só o direito à rescisão, mas também à reparação integral dos prejuízos causados, portanto, se, você está enfrentando uma situação semelhante, não se cale. A via judicial é o caminho legítimo para garantir seus direitos e restabelecer a justiça.

Gustavo Rafael da Rocha Silva: Graduado em Direito pela Universidade do Estado de Mato Grosso (2017). Técnico em Transação Imobiliária pelo Centro de Tecnologia e de Educação Profissional – CETEPS (2018). Pós-graduando em Advocacia Imobiliária, Urbanística, Registral e Notarial pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC em Parceria CFOAB/ENA.

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